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Flâneur da Era Contemporânea

Ao meu olhar, flâneur é aquele indivíduo que possui um par de asas na alma, a inteligência na boca do coração e o gosto pelo novo no emaranhado do cérebro. Imerge na multidão, sem direção nem desígnio, recolhe suas impressões e as registra imediatamente.

Esse curioso personagem da Era Moderna, que recupera do poder divino o crédito pessoal da sua poética, ainda incita o pensamento urbano contemporâneo. Errante e misterioso faz de um perambular aparentemente descompromissado pelas ruas, matéria-prima e fonte de inspiração, característica expressa na obra de Charles Baudelaire, que desvenda um flâneur incógnito, diluído no movimento ondeante desse existir grupal. Também na obra de Edgar Allan Poe, surge o personagem em destaque, que adeja entre todos e ao mesmo tempo é só.

No Brasil, é o “boêmio”, destacado no Rio de Janeiro entre o final do século XIX e início do século XX. Equivocadamente chamado de “vagabundo”, perambula vadio com as lâmpadas da inteligência e da observação bem acesas. Neste sentido é: Vadio + Inteligente + Observador.

Nos dias de hoje praticamente impossível manter esta poética errante ativa, em particular porque as atitudes expressariam medo e o foco da observação seria a violência urbana. Perdeu-se a pureza inicial - a subjetividade alastrou-se pelo mundo real. A visão imparcial submergiu ao passado e o flâneur das calçadas iluminadas pelo luar encontra-se quase extinto.

Será? Personagem de tão rica imaginação permitir-se-ia morrer? Claro que não. Ameaçado, cria novos espaços. Pode reunir-se com um grupo – nem sempre o mesmo – em lugares charmosos – sempre diferentes. Resta-lhe ainda o interior dos shopping centers ou o mundo virtual, onde trafega por espaços curiosos e inquietantes e bem mais amplos. Sempre no burburinho das palavras faladas ou da rapidez das palavras que ocupam as telas dos computadores. Nunca ou quase nunca as mesmas pessoas ou os mesmos lugares. Sem raízes. Sempre muita gente e sempre muito só. Espectro fascinante da solitude.

Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Rio de Janeiro, 14 janeiro 2011 às 3h8
Comentário à publicação de Marco Bastos – O FLÂNEUR E A PEDRA QUE CRESCE
http://peapaz.ning.com/profiles/blogs/o-flaneur-e-a-pedra-que-cresce
 
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 14/01/2011
Alterado em 22/05/2018
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