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NORMA JURÍDICA
- resumo de aula -
 
1 CONCEITO DE NORMA JURÍDICA
 
A palavra norma vem do latim norma (esquadro, régua), e revela, no campo da conduta humana, a diretriz de um comportamento socialmente estabelecido. Por isso, o adjetivo normal refere-se a tudo que seja permitido ou proibido no mundo humano, no mundo ético; e refere-se, também, a tudo que, no mundo da natureza, no mundo físico, ocorre, necessariamente, como descrito num enunciado físico. Anormal é a qualidade daquilo que se mostra contrário às concepções admitidas num dado momento histórico.
 
2 VIGÊNCIA DA NORMA JURÍDICA
 
VIGÊNCIA
Vigência é aptidão para produzir efeitos juridicamente válidos.
Com a palavra vigência, diz Kelsen, designamos a existência específica de uma norma.
 
Para a norma jurídica ingressar no mundo do Direito, produzindo seus efeitos, é necessário que tenha vigência ou, no dizer de Paulo Nader, validade formal, que significa preencher os requisitos técnico-formais na sua criação. Se o processo de formação da lei foi irregular, sem que tenha havido, por exemplo, tramitação pelo Senado Federal, as normas não obterão vigência.
Para Paulo Dourado de Gusmão, no sentido técnico-jurídico, vigência diz respeito à dimensão temporal e espacial da obrigatoriedade do Direito. Determinável, começa da data em que for publicada a norma no Diário Oficial, ou da data nela prevista, terminando na sua revogação, quando lei posterior dispuser em sentido contrário.
Dizer que uma norma é válida significa sempre dizer que ela vale para um qualquer espaço ou para um qualquer período de tempo.
 
3 VIGÊNCIA DA LEI NO TEMPO
 
3.1 Início da vigência da lei
 
Após a sanção, a lei já existe e é válida, pois a promulgação é ato declaratório de sua existência. Todavia só terá vigência a partir da data disposta nela mesma. Não sendo mencionada no texto de lei a data a partir da qual deve entrar em vigor, prevalecerá a regra geral do art. 1º da LICC que diz: “Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país 45 (quarenta e cinco) dias depois de oficialmente publicada.”
Exemplo:
Publicação da lei: 1º de março de 2003.
Passa a viger: 15 de abril de 2003.
 
3.2 Vacatio legis
 
É o período que medeia a data de publicação da lei e a de sua entrada em vigor. O período de vacância da lei dependerá da complexidade da matéria que abrange.
Exemplo:
O Código Civil em vigor teve um período de vacatio legis de 1 ano.
Publicação da lei: 11 de janeiro de 2002.
Passou a viger: 11 de janeiro de 2003.
A lei vige a partir da zero hora do dia imediatamente seguinte à consumação integral do prazo. Sendo assim, as regras da sucessão, por exemplo, correrão para pessoa falecida às 23:59hs do dia 10 de janeiro de 2003, de acordo com o Código Civil de 1916 e, para aquela falecida às 00:01 hs do dia 11 de janeiro de 2003, ficarão por conta do disposto no Novo Código Civil de 2002.
Diz o § 3º do art. 1º da LICC que, se antes da lei entrar em vigor ocorrer nova publicação do seu texto, com vistas à sua correção, o prazo deste artigo e dos parágrafos anteriores começará a correr da nova publicação. O § 4º do mesmo dispositivo salienta que as correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova.
 
3.3 Princípio da Obrigatoriedade das Leis
 
Decorrente da publicação erige-se o Princípio da Obrigatoriedade, segundo o qual ninguém poderá se escusar de cumprir a lei, alegando que não a conhece (art. 3º da LICC: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”). Trata-se de razão de interesse público. Publicada a lei, esta passa a ser do domínio de todos, sem exceção.
O Princípio da Obrigatoriedade das Leis, atualmente, comporta poucas exceções (Ex: art. 8º da Lei de Contravenções Penais: “[...] no caso de ignorância ou errada compreensão da lei, quando escusáveis, a pena pode deixar de ser aplicada”).
 
Princípio da Obrigatoriedade Progressiva
 
Houve, em nosso país, época em que se falava no Princípio da Obrigatoriedade Progressiva. Isso ocorria quando o início da obrigatoriedade iniciava-se por partes: primeiro nas regiões mais próximas e depois nas mais remotas da sede do governo.
 
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Introdução ao Código Civil – art. 2º (1916 – Revogado)
“A obrigatoriedade das leis, quando não fixem outro prazo, começará, no Distrito Federal, três dias depois de oficialmente publicadas, quinze dias no Estado do Rio de Janeiro, trinta dias nos Estados marítimos e no de Minas Gerais, cem dias nos outros, compreendidas as circunscrições não constituídas em Estados. Parágrafo Único: Nos países estrangeiros a obrigatoriedade começará quatro meses de oficialmente publicada na Capital Federal”.
03 dias  DF(GB) – capital cidade do Rio de Janeiro
15 dias  RJ
30 dias  Estados Nordestinos e MG
100 dias               outros Estados da Federação
04 meses            outros países
 
Princípio da Obrigatoriedade Simultânea
 
Através deste princípio, a lei entra em vigor em todo o país a um só tempo.
LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Lei de Introdução ao Código Civil (LICC) – art. 1º e § 1º (1942) – em vigor
“Art. 1º: Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o País 45 (quarenta e cinco dias) depois de oficialmente publicada”.
§ 1º: Nos Estados estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia 3 (três) meses depois de oficialmente publicada”.
45 dias  em todo o território nacional
03 meses            outros países
 
A lei entrando em vigor e não se destinando a ter uma duração temporária (prazo determinado), vigorará até que outra lei a modifique ou revogue. Daí decorrem alguns princípios vistos a seguir.
 
3.4 Princípio da continuidade das leis
 
Este princípio está contemplado no art. 2º da LICC, quando menciona que não se destinando à vigência temporária, uma lei só deixa de vigorar quando modificada ou revogada por outra posterior.
A revogação pode ser:
a) expressa: quando a lei se refere explicitamente à anterior, ordenando sua revogação;
b) tácita: quando a lei posterior regula inteiramente a matéria de que tratava a anterior.
 
LEI PERMANENTE
A vigência da lei permanente permanece até sua modificação ou revogação (ab-rogação ou derrogação).
Distinção entre derrogação e ab-rogação:
Derrogação significa revogação parcial.
Ab-rogação diz respeito à revogação total.
Ambas, derrogação e ab-rogação, são espécies do gênero revogação.
 
LEI TEMPORAL
A vigência da lei temporal é limitada quanto à sua necessidade. A lei que nasce com um prazo determinado, vigorará até que este se extinga.
Exemplos:
1 A lei que fixa os limites para os abatimentos de renda bruta das pessoas físicas na declaração de rendimentos apresentada no exercício. Tal lei vigora apenas para o exercício a que se refira. Para o exercício seguinte surgirá uma nova lei, estabelecendo novos limites.
2 Uma lei que fixa a tabela de preços de artigos de consumo.
 
LEI EXCEPCIONAL
A lei excepcional é a que vige em situações de emergência e permanece enquanto persistirem as circunstâncias que a motivaram.
Exemplo:
1 A lei que fixa a declaração do estado de sítio.
2 A lei que declare um estado de emergência.
 
3.5 Conflitos da lei no tempo: direito intertemporal
 
Sempre que uma lei entrar para o ordenamento jurídico, existirá uma espécie de divisão temporal: o antes e o depois daquela lei. Em decorrência, surgem conflitos relativos à matéria tratada no art. 2º da LICC e que se denominam conflitos das leis no tempo.
Os critérios para solução desses conflitos são estudados sob a denominação de DIREITO INTERTEMPORAL, que cuida da aplicação da lei no tempo.
O conflito das leis no tempo nasce da colisão da lei nova com a anterior. Muitas vezes permanecem consequências da lei antiga, sob a vigência da lei nova. E, muitas vezes, situações que foram criadas pela lei antiga já não encontrarão apoio na lei nova. Então há que se estudar até que ponto a lei antiga pode gerar efeitos e até que ponto a lei nova não pode impedir esses efeitos da lei antiga.
São preceitos fundamentais do DIREITO INTERTEMPORAL:
a)            a lei se aplica aos fatos posteriores à sua entrada em vigor. Mas, em disposições transitórias, a lei pode estabelecer que alguns desses fatos continuarão regidos pela norma revogada durante certo tempo;
b)           a lei não se aplica aos fatos anteriores à sua vigência. Mas, através de dispositivos retroativos, pode a lei estabelecer que alguns desses fatos serão regidos pela nova norma.
Como se vê existem exceções aos preceitos fundamentais do DIREITO INTERTEMPORAL. Duas são as questões envolvidas com a aplicação da lei no tempo:
a) a das DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS (ultratividade da lei);
b) e a da RETROATIVIDADE DAS LEIS.
 
3.5.1 Princípio da Ultratividade da Lei: Disposições Transitórias
 
Vimos que a lei nova revoga a anterior quando trata sobre o mesmo assunto de forma diversa. Desta forma, nos fatos ocorridos após sua revogação, a lei antiga não produzirá qualquer efeito, cessando, desta forma, sua eficácia.
Mas, com relação aos fatos ocorridos anteriormente à edição da nova lei, a lei antiga poderá continuar produzindo efeitos, por certo tempo. Tal fenômeno é chamado de ULTRATIVIDADE DA LEI.
Eis alguns exemplos:
1 Na época da SUNAB, um comerciante qualquer desrespeitou a tabela de preços estabelecida por aquele órgão, vendendo acima de seus limites sua mercadoria. Autuado, processado, a tramitação de seu caso vem a ser demorada, a ponto de, ao ser condenado, a tabela de preços que ele havia infringido já não ser a vigorante, substituída por outra em que os preços são bem mais altos.
Pergunta-se: Poderia o comerciante ser condenado pela infração praticada por ocasião da vigência da tabela antiga?
Resposta: Sim, à luz do disposto no art. 3º CP.
 
LEI EXCEPCIONAL OU TEMPORÁRIA
art. 3º do Código Penal: A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.
TEMPO DO CRIME
art. 4º do Código Penal: Considera-se praticado o crime no momento da ação ou omissão, ainda que outro seja o momento do resultado.
 
2 O Código Civil contempla várias disposições transitórias, incluindo aquelas relativas aos institutos abolidos. É o caso da enfiteuse (direito real).  Em desuso, entendeu o legislador por bem aboli-lo do ordenamento jurídico nacional. Sendo assim, ninguém mais poderá, a partir da vigência do Novo Código Civil (11 de janeiro de 2003), instituir este direito real sobre imóveis de sua propriedade. Contudo, as enfiteuses anteriormente constituídas serão abrigadas por norma de caráter transitório, estabelecida no art. 2.038 do CC, segundo a qual as enfiteuses existentes quando da entrada em vigor do Código Civil continuarão subordinadas, até sua extinção, às normas do Código Civil de 1916, revogado.
 
3.5.2 Princípio da Retroatividade e Irretroatividade das Leis
 
Por retroatividade da lei entende-se que a lei nova pode atingir situações abrangidas por leis anteriores. Ao contrário, por irretroatividade das leis a lei nova não pode atingir situações reguladas pela lei anterior.
No Direito Penal brasileiro admite-se a retroatividade da lei que de certa forma seja mais benigna ao acusado. É o que diz a CRFB no art. 5º, inc. XL: “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.”
O princípio da irretroatividade encontra respaldo em nosso ordenamento jurídico tendo em vista a necessidade de segurança e estabilidade necessários à vida em sociedade. Assim, tem-se a certeza de que o direito atual não será violado pela futura lei.
Dispõe o art. 6º da LICC que “a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada”. No mesmo diapasão dispõe o inciso XXXVI do art. 5º da CRFB/1988: “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Assim, para entendermos a irretroatividade, é importante que se entenda o que significa ato jurídico perfeito, direito adquirido e coisa julgada.
 
ATO JURÍDICO PERFEITO
Ato jurídico perfeito é aquele que se realizou inteiramente sob a vigência de determinada lei. Assim, se alguém comprou alguma coisa, pagando na hora o respectivo preço total, o direito daquela pessoa sobre tal coisa está consumado, não podendo ser atingido por lei nova.
 
DIREITO ADQUIRIDO E A TEORIA DE GABBA
Direito adquirido é aquele que, na vigência de determinada lei, por ter sido produzido por fato idôneo, incorporou-se ao patrimônio de seu titular (Teoria de Gabba). Diz-se, portanto, direito adquirido quando integrado definitivamente o direito no patrimônio do titular, porque se reuniram os elementos próprios, ou se praticaram todos os atos necessários.  Os direitos adquiridos incorporam-se ao titular, de imediato, com o implemento dos elementos componentes de seus fatos geradores, dependentemente, ou não, de sua vontade, conforme o caso (fatos voluntários ou naturais).
Foi Gabba o último grande teórico do direito adquirido, marcando nova fase no estudo dos conflitos de leis no tempo, com sua obra Teoria della retroattivita delle leggi, Turim, Itália, em 1868. Para o referido autor, só é intangível, só não pode ser atingido pela retroatividade, o direito adquirido, pois seria este “[...] a consequência de fato idôneo para provocá-la de acordo com a lei antiga, direito esse que já deve Ter entrado no patrimônio do indivíduo.” Toda a Teoria de Gabba baseia-se nesse conceito de direito adquirido, caracterizado por ter sido produzido por fato idôneo e por já se ter incorporado ao patrimônio do indivíduo.
Ao conceito de direito adquirido opõe Gabba, a faculdade legal (ou jurídica) e a expectativa de direitos. Para o estudioso, não basta, para que seja constatado o direito adquirido, que tenhamos a faculdade de praticar certo ato, nem que tenhamos a esperança, a expectativa de que certo fato se realize. Há retroatividade quanto à faculdade e à expectativa, mas estas não constituem direitos que tenham entrado no patrimônio individual.
Mostra-nos, ainda, Gabba, que a lei nova não pode atingir o ato consumado (ato jurídico perfeito), pois, neste caso, o direito já pertence ao indivíduo, já está no seu patrimônio, já constitui direito adquirido. São atos consumados, entre outros, a sentença judicial passada em julgado e o pagamento efetuado. O princípio geral para Gabba é o da não retroatividade. Na realidade, só não há retroatividade no caso do direito adquirido, isto é, o direito adquirido é o limite da retroatividade.
Exemplo: alguém pode aposentar-se por exercer atividade penosa após 25 anos de serviço. Apesar de passados os anos exigidos, não se utiliza a vantagem. De repente, sobrevém uma lei que considera tal atividade não penosa e alarga o tempo exigido para aposentadoria para 30 anos. Mesmo não tendo o indivíduo exercido o seu direito à época em que completou os 25 anos de serviço (sob a vigência da lei antiga), poderá valer-se da lei antiga para obter o benefício, uma vez que o direito já estava adquirido à época da mudança da lei.
Dispõe o parágrafo 2º, do art. 6º, da LICC: “Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem”.
A noção de direito adquirido, em que pese a sua influência no campo do direito tradicional, tem sido modernamente abandonada para substituir-se pela teoria dos chamados fatos consumados.
Ferrara preconiza, para solução dos problemas da irretroatividade, o princípio tempus regit factum, pelo qual os fatos se regem pela lei vigorante à época de sua ocorrência. Assim, uma lei antiga conserva sua capacidade de produzir efeitos, mesmo sob a vigência de nova lei. Isto, porém, só se dá de matéria de interesse exclusivamente privado. Se assim não fosse, não seriam possíveis leis como a da abolição da escravatura, que extinguiu efeitos do regime legal anterior.
José Afonso da Silva diz acerca do conceito de direito adquirido:
A doutrina ainda não fixou com precisão o conceito de direito adquirido. É ainda a opinião de Gabba que orienta a noção, destacando como seus elementos caracterizadores: 1º) ter sido produzido por um fato idôneo para sua produção; 2º) ter se incorporado definitivamente ao patrimônio do titular. A Lei de Introdução ao Código Civil declara que se consideram adquiridos os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo o começo do exercício tenha termo pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem (art. 6º, § 2º).
Para compreendermos um pouco melhor o que seja o direito adquirido, cumpre relembrar o que se disse acima sobre o direito subjetivo: é um direito exercitável segundo a vontade do titular e exigível na via jurisdicional quando seu exercício é obstado pelo sujeito obrigado à prestação correspondente. Se tal direito é exercido, foi devidamente prestado, tornou-se situação jurídica consumada (direito consumado, direito satisfeito, extinguiu-se a relação jurídica que o fundamentava). Por exemplo, quem tinha o direito de casar de acordo com as regras de uma lei, e casou-se, seu direito foi exercido, consumou-se. A lei nova não pode descasar o casado, porque estabeleceu regras diferentes para o casamento.
Se o direito subjetivo não foi exercido, vindo a lei nova, transforma-se em direito adquirido, porque era direito exercitável e exigível à vontade de seu titular. Incorporou-se no seu patrimônio, para ser exercido quando lhe conviesse. A lei nova não pode prejudicá-lo, só pelo fato de o titular não o ter exercido antes. Direito subjetivo ‘é a possibilidade de ser exercido, de maneira garantida, aquilo que as normas de direito atribuem a alguém como próprio.’ Ora, essa possibilidade de exercício continua no domínio da vontade do titular em face da lei nova. Essa possibilidade de exercício do direito subjetivo foi adquirida no regime da lei velha e persiste garantida em face da lei superveniente. Vale dizer - repetindo: o direito subjetivo vira direito adquirido quando a lei nova vem alterar as bases normativas sob as quais foi constituído. Se não era direito subjetivo antes da lei nova, mas interesse jurídico simples, mera expectativa de direito ou mesmo interesse legítimo, não se transforma em direito adquirido sob o regime da lei nova, que, por isso mesmo, corta tais situações jurídicas subjetivas no seu iter, porque sobre elas a lei nova tem aplicabilidade imediata, incide.
Não se trata aqui da questão da retroatividade da lei, mas tão-só de limite de sua aplicação. A lei nova não se aplica a situação subjetiva constituída sob o império da lei anterior.
Vale dizer, portanto, que a Constituição não veda a retroatividade da lei, a não ser da lei penal que não beneficie o réu. Afora isso, o princípio da irretroatividade da lei não é de Direito Constitucional, mas princípio geral de Direito. Decorre do princípio de que as leis são feitas para vigorar e incidir para o futuro. Isto é: são feitas para reger situações que se apresentem a partir do momento em que entram em vigor. Só podem surtir efeitos retroativos, quando elas próprias estabeleçam (vedado em matéria penal, salvo a retroatividade benéfica ao réu), resguardados os direitos adquiridos e as situações consumadas evidentemente.  (grifos do autor)
 
O ponto de vista emitido pelo autor demonstra claramente lastrear-se no critério subjetivo, ao delimitar o sentido do instituto em análise. Porém, existe outra acepção, fundada em critérios eminentemente objetivos, cujo principal propugnador foi Paul Roubier, descrita em linhas gerais por Octávio Bueno Magano nestes termos:
Dada a multiplicidade das normas de natureza trabalhista, é frequente que disponham sobre a mesma matéria, umas se sobrepondo ou sucedendo a outras. Tratando-se de sobreposição, a colisão resultante se dirime de acordo com as regras de hierarquia das normas jurídicas; tratando-se de sucessão, o conflito se resolve conforme os cânones do direito transitório ou intertemporal, que, em resumo, são os seguintes: 1) aos facta praeterita se aplica o direito vigente ao tempo em que se constituíram; 2) aos facta pedentia se aplica preponderantemente o direito novo; 3) aos facta futura se aplica exclusivamente o direito novo.
Facta praeterita são todos aqueles que ocorrem antes do advento da lei nova e cujos os efeitos já foram inteiramente regulados pela lei anterior. Se a lei nova os alcançasse, iria resolver o passado já sedimentado. Com razão escrevia Portalis: 'o homem, que não ocupa senão um ponto no tempo e no espaço seria o mais infeliz dos seres, se não pudesse julgar seguro nem sequer quanto à sua vida passada. Por essa parte de sua existência, já não carregou todo o peso de seu destino?’ Os facta praeterita são por isso mesmo protegidos pelo princípio da irretroatividade das leis.
Facta pendentia são aqueles cujos efeitos se projetam no tempo, regulando-se os efeitos anteriores ao advento da lei nova pela lei vigente ao tempo em que os mesmos fatos se constituíram e os posteriores pela lei nova. Ao reconhecimento de que a lei nova alcança os efeitos posteriores do facta praeterita, corresponde a doutrina difundida por Roubier do efeito imediato da lei nova.
Mas o quadro supra-descrito supõe que a lei nova encerre norma de direito público ou de ordem pública; tratando-se de lei meramente dispositiva, os efeitos posteriores dos facta pendentia podem continuar sob o império da lei anterior, se nesse sentido for a vontade das partes.
Facta futura são aqueles cuja constituição e efeitos se produzem sob a regência da lei nova."
 
Não raramente se afirma que não há direito adquirido em face da lei pública ou de Direito Público. José Afonso da Silva afirma não ser correta a generalização dessa interpretação, pois “não corre direito adquirido contra o interesse coletivo, porque aquele é manifestação de interesse particular que não pode prevalecer sobre o interesse geral. A Constituição não faz distinção.”
 
A) Faculdade legal (ou jurídica)
 
É um mero poder conferido a determinada pessoa para realizar determinada ação. Não é propriamente um direito, mas “[...] um modo pelo qual o direito se manifesta em dadas circunstâncias”, como diz Clovis Bevilaqua. A Faculdade Jurídica consiste, assim, na possibilidade que tem o indivíduo de exercer certo direito.
Exemplo: Casar-se, conferir um mandato, comprar, vender, etc.
 
B) Expectativa de direito
 
É a possibilidade de se vir a ter um direito. Portanto, não confere direitos.
Há determinados direitos que somente são anexados na esfera jurídica do titular aos poucos, por etapas, de forma que vão, paulatinamente, com o tempo, complementando os elementos que lhes faltam. Diz-se que nesses casos há uma EXPECTATIVA DE DIREITO. Há um direito em formação, ainda dependente de algum elemento. Exemplos: os direitos dependentes da prática de atos sucessivos, como o pagamento de bem adquirido a prazo; os direitos sob condição suspensiva ou resolutiva, que ficam sob influência de fato futuro e incerto; os direitos submetidos a termo certo ou não, entre outros. Ensina, a respeito, Carlos Alberto Bittar: “há uma expectativa de direito, ou situação jurídica preliminar, vale dizer, estado em que alguém espera, legitimamente, o ingresso em seu patrimônio do direito cogitado.”
Diferenças entre direito adquirido e expectativa de direito. Na EXPECTATIVA DE DIREITO, este ainda não foi adquirido. Existe apenas uma esperança de que venha a sê-lo em razão de um fato. No DIREITO ADQUIRIDO este já existe integrado ao patrimônio do titular, está consumado, ou sê-lo-á necessariamente, bastando a ocorrência do termo prefixo ou o implemento da condição preestabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.
Exemplo 1: Se alguém tem 24 anos de serviço e frente à lei vigente lhe falta 1 ano para aposentar-se, este indivíduo tem uma expectativa de direito à sua aposentadoria. Caso a lei mude neste momento, terá ele que se submeter ao novo regramento.
Exemplo 2: O filho, estando seu pai ainda vivo, tem expectativa de direito quanto à herança. Entretanto, os bens de seu pai ainda não incorporaram ao seu patrimônio, não gerando, portanto, direito adquirido.
CONCLUSÕES
Se o ato não estiver terminado, a lei nova o atingirá.
A lei nova atinge as expectativas de direito.
A lei nova atinge a faculdade jurídica.
 
COISA JULGADA
Depois de decidida uma questão pelo Judiciário, se já não há possibilidade de recurso, faz a coisa julgada lei entre as partes, estabelecendo obrigações e direitos entre as mesmas. A lei nova não atingirá tais decisões. Ler a respeito da polêmica sobre a relativização da coisa julgada em razão do direito que o indivíduo tem de conhecer sua origem genética => DNA & COISA JULGADA. Os textos encontram-se na xerox da Faculdade.
 
4 VIGÊNCIA DA LEI NO ESPAÇO
 
A edição das normas jurídicas é uma das manifestações da soberania dos Estados. Pelo PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE a norma jurídica vigora e tem eficácia nos limites do território do Estado que a editou.
 
4.1 Conflitos da lei no espaço
 
O Direito Internacional Público tem por objetivo a solução de conflitos de normas jurídicas no espaço. Não se poderá considerar soberano o Estado sujeito às normas editadas por autoridade externa à sua própria organização como entidade política. Neste diapasão, refere-se que os limites espaciais de aplicação da lei são postos pelos contornos do território do Estado que a edita.
No direito brasileiro:
a)            aplica-se a lei do domicílio: questões sobre o começo e fim da personalidade, nome, capacidade e os direitos de família (art. 7º LICC);
b)           aplica-se a lei da situação dos imóveis para qualificá-los (se não móveis ou imóveis) e reger as relações que lhe forem pertinentes (art. 8º LICC);
c)            aplica-se a lei do lugar da constituição à qualificação e disciplina das obrigações: obrigação resultante de contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente (art. 9º LICC);
d)           aplica-se a lei do domicílio do defunto ou desaparecido à sucessão por morte ou ausência. Quanto à capacidade para suceder, aplica-se a lei do domicílio do herdeiro ou legatário. Mas, sobre bens do estrangeiro situado no Brasil aplicar-se-á a lei brasileira em favor do cônjuge brasileiro e filhos sempre que não lhes for favorável a lei do domicílio do falecido.
 
4.2 Efeito repristinatório
 
Ocorre na hipótese de uma lei revogadora (C) de uma lei revogadora (B) tem o efeito de restaurar, automaticamente, a lei revogada (A).
REPRISTINAÇÃO
É o fenômeno pelo qual a revogação de uma lei que por sua vez havia revogado outra lei, importa na revigoração desta.
 
O § 3º, do art. 2º da LICC diz: “Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência”.Portanto, no Brasil, é necessário que o legislador, em disposição expressa, revigore a primitiva lei revogada.
Não existe, no direito brasileiro, o efeito repristinatório.
 
Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Enviado por Sílvia Mota a Poeta e Escritora do Amor e da Paz em 07/02/2015
Alterado em 13/08/2016
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