E, ainda sigo a te amar?
Apesar de tudo,
da cinza que me cobre,
do soluço vil que açoita
esta noite insone,
dos passos que se perderam
na rua sem nome,
do silêncio que viscejou
entre nossas mãos desertas,
uma pergunta insana
rasga o meu peito:
— E, ainda sigo a te amar?
O tempo - verdugo algoz,
apunhala minh'alma
como lâmina invisível
e carrego em mim os teus ecos,
as palavras que não voltam,
os gestos dilacerados
na vidraça do destino...
Mas, há um fio ardente
que resiste atrevido,
uma chama clandestina
na dobra mais secreta da pele,
um sussurro que insiste
mesmo no abismo:
— E, ainda sigo a te amar?
Talvez o amor seja isto:
clausura inesquecível,
um cárcere injusto
de lembranças justas,
uma asa ferida e corajosa
que insiste em voar,
um corpo de pedra
que não desaprende
o fogo da paixão.
Apesar de tudo,
sim, eu sigo a te amar —
mesmo sabendo
que esse amor é navalha
e me corta e retalha e estraçalha
toda vez que respiro
e inspiro o teu nome.
Sílvia Mota
Poeta e Escritora do Amor e da Paz
Rio de Janeiro, 25 de agosto de 2025 - 02h20